A Europa justapõe grupos linguísticos, étnicos,
históricos, portanto de natureza e origem dessemelhantes, que se consideram
nações. O movimento das nacionalidades supõe ao mesmo tempo a existência de
nacionalidades e o despertar do sentimento de que se faz parte dessas
nacionalidades.
O movimento das nacionalidades cobre no tempo um período
longo, que se estende por todo o século XIX. Desde 1815 o fato nacional se
afirma, e com que força! Às vésperas de 1914, ele nada perdeu de sua
intensidade; na Europa, ele se prolongará bem além do conflito e contontrará
até um quadro ampliado pelos movimentos de descolonização.
Quase todos os países europeus se encontram às voltas com
problemas de nacionalidade: a Grã-Bretanha, com o prolema da Irlanda; a França,
com a perda da Alsácia e da Lorena em 1871, conserva até a guerra de 1914 a
nostalgia das províncias perdidas; a Espanha, onde o regionalismo basco, o
particularismo catalão entram em luta com a vontade unificadora e
centralizadora da monarquia.
Ocorre com mais razão quando nos deslocamos para leste, onde
fronteiras ainda são instáveis, onde a geografia política ainda não tomou forma
definitiva, onde as nacionalidades estão à procura de si mesmas e em busca de
expressão política. A Itália e a Alemanha, para as quais o século XIX é o
século da unidade, a Áustria-Hungria, os Bálcãs, o Império Russo, com as
províncias que resistem a russificação, tem problemas de nacionalidade.
Dinamarca, com a Guerra dos Ducados em 1862, a Suécia, que se desmembra em 1905,
a Noruega, com sua luta pela secessão. Fora a Europa, podemos mencionar a
América; o Japão, onde o sentimento nacional inspira o esforço de
nacionalização; a China, onde a revolta dos boxers, em 1900, constitui um
fenômeno nacionalista.
O fato nacional procede, no século XIX, também de uma fonte:
o 'historicismo'.
A história fornece a redescoberta do passado. Ao mesmo
tempo, a língua nacional é ressuscitada. Revivem-se as epopeias nacionais, os
cantos tradicionais. As minorias voltam a falar a própria língua e a evitar a
língua do opressor.
Quando o opressor pratica outra religião que não a da
nacionalidade submetida, religião e nacionalismo se confundem.
Após a derrota dos movimentos inspirados na Revolução
Francesa, entre 1849-1850, acredita-se menos na sublevação espontânea do povo,
no impulso irresistível das massas, para depositar mais confiança nos meios
clássicos, na guerra estrangeira, na diplomacia tradicional, nas alianças
externas; é o abandono da mitologia romântica da insurreição, do povo em armas,
do recrutamento em massa.
No final do século XIX, nota-se o aparecimento de
rivalidades étnicas mais sutis. Nacionalidades do mesmo ramo étnico descobrem
suas afinidades, tomam consciência da solidariedade que as ligam e esboçam
reagrupamentos em função dessas afinidades. É o caso, dentro da dupla monarquia
austro-húngara, primeiro da coalizão dos eslavos do Sul, depois, da coalizão
entre eslavos do Sul e os do Norte e, enfim, a aproximação entre todas as
nacionalidades eslavas da Europa e o grande irmão russo. Contra o
pan-eslavismo, esboça-se um bloco austro-alemão, que sonha em tornar realidade
o programa do pangermanismo.
O confronto entre o pan-eslavismo e o pangermanismo é um dos
componentes do conflito mundial e carrega em si o germe da ruína dos Habburgos.
O movimento das nacionalidades triunfará, em 1918-1920, sobre o direito
histórico.
Texto adaptado de René Remond, O século XIX, pg. 149-163.
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